domingo, dezembro 21, 2008

ESTREAMOS!!! Uma primeira crítica:

Teresa e o Aquário


Contemplar-se

“Entra Jasão e dirige-se à Medéia (...)

MEDÉIA

Maior dos cínicos! (É a pior injúria que minha língua tem para estigmatizar a tua covardia!) Estás aqui, apontas-me, tu,meu inimigo mortal? Não é bravura, nem ousadia, olhar de frente os ex-amigos depois de os reduzir a nada! O vício máximo dos homens é o cinismo. Mas, pensando bem, é preferível ver-te aqui; abrandarei meu coração retribuindo teus insultos e sofrerás ouvindo-me. (...) Tratado assim por nós, homem mais vil de todos, tu me traíste e já subiste em leito novo! (...) Ah! Esta mão direita e estes meus joelhos que tantas vezes seguraste! Ah! Foi em vão que tantas vezes me abraçaste, miserável! Como fui enganada em minhas esperanças!... (...)

Não quero uma felicidade tão penosa, nem opulência que me esmague o coração!”

EURÍPIDES. Medéia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, (s.d.). P. 36 – 41.

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Há um aquário que, um dia, fica vazio porque a água toda escorre pela casa como também o amor escorre por todo o mundo quando estamos apaixonados. Há um peixe dentro do aquário que está vazio porque a água, assim como o amor, foi embora. O peixe não se convence da morte e luta contra ela. Então, encosta sua cabeça no fundo tentando respirar até que não se lembra mais de nada.

Tereza estava com cabeça no fundo do seu aquário quando Ele voltou. Ele, seu ex-marido que se foi, que não a valorizou, que partiu, que sumiu a inundar o mundo. Ele volta. Chama por ela uma vez. Quer falar. Chama outra. E outra. E outra. Ela resiste. Os dois brigam. O amor, como água se foi. Que ele também se vá.

Tereza veste um vestido branco sem nada além de branco como também é o chão. Ele veste uma calça preta sem nada cobrindo o peito. Os dois estão descalços. A luz é geral. O aquário é um balde comum cheio de água comum. Nem uma única palavra é dita.

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Eurípides escreveu Medéia em 431 a. C. João de Ricardo pré-estreou “Tereza e o Aquário” ontem. Um marido que se vai. Uma mulher que fica. Um rancor que se guarda.

O que há entre João de Ricardo e Eurípides é 2.439 anos de diferença. O que há entre nós e João de Ricardo é um caminho incerto entre o que fazemos e sentimos e o que percebemos que fazemos e o que percebemos que sentimos. Porque qualquer um pode montar Medéia hoje, mas não é qualquer um que representar a si mesmo, a sua geração, o nosso conflito. Não é da relação homem e mulher que falamos ao citar Medéia. Tampouco ao enaltecer os valores de Tereza e o Aquário, produção da Espaço em Branco. Mas é porque o cinqüentão Eurípides contou a sua versão e utilizou o seu tempo para contar a história que queria. Hoje lemos a tragédia e sentimos o século IV antes de Cristo. Agora, assistimos a “Tereza” e nos sentimos como parte de uma história no quase verão de 2008-2009. João de Ricardo, trintão, nos deixa sentir o nosso próprio tempo. Somos no palco.

Não temos regras e as que há não incidem sobre nossas decisões como outrora aconteceu com nossos pais. Os atores não definem um fim ou um início. Sissi Venturin come bergomotas (?) e Lisandro Bellotto faz nós em gravatas. Nem sempre sabemos o que dizer, nos debatemos como loucos em busca do quê e de que formas se expressar. Tereza se joga no chão, baila sobre a atriz que a interpreta. E a liberdade conquistada antes de nós nos deixa sem ideologia, imersos sobre luzes coloridas e bichos pequenos vistos como se fossem grandes. Nossos celulares tocam até mesmo quando estamos fazendo cocô, personagens de uma tragédia grega, dispostos conforme nos pedem os deuses sem que saibamos bem quais, quem e quantos são eles. Nossa visão não é/está nítida porque estamos no fundo do mar e olhamos com olhos de mergulhadores para a realidade que nos envolta.

Duas horas de um espetáculo que nos coloca como Tereza a olhar o seu aquário e ver-se no lugar do peixe. Poderia ser uma hora e meia, houvesse menos projeção e mantida a atuação no valor que já tem. Afinal, o sublime do espetáculo está nas sementes e não na árvore inteira que cresce na medida em que a água dos aquários sai.

O onírico está em contemplar-se com interesse e emoção. Palmas!

Rodrigo Monteiro

Licenciado em Letras - Português/Inglês pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos.Bacharel em Comunicação Social - Habilitação Realização Audiovisual pela mesma universidade. E mestrando em Artes Cênicas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
http://teatropoa.blogspot.com/

Um comentário:

Rodrigo Monteiro disse...

vi

A SERPENTE
EXTINÇÃO
ANDY/EDIE
TERESA E O AQUÁRIO

que pena que teatro não tem box