sexta-feira, dezembro 14, 2007

Neruda - Brazilian Girls - FUGA!

Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.

Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas llenas del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.

Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
déjame que me calle con el silencio tuyo.

Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.

Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.

(Pablo Neruda - viente poemas de amor y una canción desesperada)]

Esse poema foi belamente musicado pelos descolados da BRAZILIAN GIRLS, banda novaiorquina que anda tocando direto no meu winamp e que virou trilha da saída dos espectadores no FUGA!
Aliás, a mini-temporada de estréia foi bacaníssima trazendo a galera para o Espaço do LUME-TEATRO em massa. A peça dividiu opiniões, todas acaloradas e tivemos a possibilidade de ir tarsformando o espetáculo na experiencia direta com o público. Está ai a raiz performática do FUGA!, comunicação sempre líquida e direta com os espectadores, atendo a entropia e a diferença.
Ae vai uma videoarte meio toca que encontrei no youtube que um cara fez em cima da música dos Brazilian. São camadas e mais camadas de referencia. Intertextualidade pura e o afeto do silencio alheio.


domingo, dezembro 02, 2007

Hijikata com insolação



Um pouco de dor de cabeça, peguei muito sol hoje, o sol do meio dia no lombo, cozinhando as idéias que ainda estão muito perto do couro cabeludo. Estou lendo "Butoh, veredas dálma", livro de Maura Biochi sobre Butoh, obviamente. Escrevo isso depois de um ensaio aberto do FUGA! um xis burguer e convivência VERY humana. É interessante ver que realmente tanto a arte como a vida dependem dos mesmos mecanismos, e que é certo que o olhar edita. tanto o olhar particular quanto o olhar do outro são a chave e o centro da maravilha e do hardcorismo que é ser humano. Perceber e agregar a diferença é um assunto perpétuo uma dessas grandes questões colossais do pensamento humano. Até onde chegar com isso? Até onde a opinião do público, ou melhor dizendo, do outro, é válida como um estímulo a fomentar novas questões e ações ou até onde ela é apenas o rumor de uma insatisfação egóica que não vê a obra em si, mas apenas como "eu gostaria que ela fosse". Existem diferenças entre dialogar e servir a sua subjetividade como num buffet. O olho se alimenta e, no final das contas, percebe o gosto que quer. Somos reféns do olhar. Ao perceber isso, reféns e terroristas.
No livro, existe um capítulo chamado "o último discurso de Tatsumi Hijikata", discuro esse de um dos polos fundadores da idéia e da prática do Butoh juntamente com Kazuo Ohno. Digo polaridade pois se o paradoxo está na base do Butoh, as práticas e entendimentos de Hijikata e Ohno se contradizem e se completam. Coexistência do paradoxo.

No discurso proferido em razão de um festival de Butoh em 1985, ano da sua morte, Hijikata reflete sobre a razão da sua dança, e os pricípios poéticos da sua arte. A morte e a sombra são os norteadores do trabalho do artista japonês. Num dos parágrafos ele discorre sobre a importância dos mortos no sua dança:

"Muitas vezes eu disse que uma irmã mais velha vive dentro do meu corpo. Quando tento levantar ela se abaixa. Quando me ocupo da minha dança ela come as trevas no meu corpo. Quando ela cai, isso significa muito mais do que eu ficar em pé. Muitas vezes ela fala para mim:"você é doido pela sua dança.Mas o que você está tentando exprimir só poderia expressar se não expressasse. Não é Kuninho?

Por causa disso ela se tornou minha professora. Sim, os mortos são meus professores. É preciso respeitar os mortos e gostar deles. Mais cedo ou mais tarde seremos chamados também. temos que trazer os mrotos para pertod e nós e conviver com eles. Hoje em dia as pessoas apreciam apenas a luz. Mas a quem a luz deve a sua prórpia existência? Às costas das trevas, pois elas carregam luz. Os pequenos brincalhões devoraram as trevas.Agora a noite não tem mais obscuridade, nem trevas. No passado as trevas eram claríssimas."

O que dizer após isso? Quem são esses mortos ou o que são? Quem são os mortos que animam a a arte que tento fazer? que arte é essa? A luz vive da treva e vice-versa, quem nutre minha luz? E a sua?
Apenas transcreví esse trecho para compartilhar e continuar o spam mental, ou a escultura de pensamento desse grande artista. só o eco da sua arte já mexe profundamente. Prova irrefutável de que Hijikata estava correto em relação aos seus e nossos mortos e sobre uma das infidáveis e paradoxais possibilidades da arte: a mastigação da treva. Seja isso visível ou invisível para você.

quinta-feira, novembro 29, 2007

FUGA! Estréia dia 07-12

FUGA!
(líquidos corpos)

Sobre o espetáculo...(Sinopse).


Memórias, evocações e projeções dos performadores - em relação - visam trazer o público para dentro da cena, e, em alguns momentos, os performadores para fora dela. A partir de situações de espelhamento, provocações e compartilhamento de sensações, o espetáculo pretende criar um ambiente físico sensível, abrindo-se para diferentes leituras, numa proposta que constrói sua própria lógica.
Neste aquário imaginário - um recorte de espaço/tempo - abrem-se temas que surgiram do próprio processo, como: pontos de vista, opiniões, relações líquidas, medo e tempo. Encontramos provocações no livro “Amor Líquido – sobre a fragilidade dos laços humanos” de Zygmunt Bauman, e em algumas imagens da fotógrafa americana Diane Arbus, que serviram para criação e discussão durante o processo de criação.
“Por favor, não desliguem os celulares, mantenham algum tipo de contato com a realidade lá de fora...”.

Sobre o processo...
As fronteiras entre a dança e o teatro têm sido um dos focos fomentadores das pesquisas contemporâneas em Artes Cênicas. O Núcleo Fuga! está experimentando na prática a potencialidade criativa que a união entre atores e bailarinos traz. Além dos performadores possuírem formação nas duas linguagens, foram utilizados especificamente alguns procedimentos do Lume-teatro e a técnica Klauss Vianna de dança, por possuírem concepções de trabalho que se relacionam.
Para tanto Renato Ferracini e Jussara Miller propuseram, separadamente, encontros nos quais foram exercitadas questões essenciais a esses trabalhos, criando um vocabulário pré-expressivo para o coletivo estruturar sua criação. A escolha por trabalhar essas informações em separado foi tomada para que a contaminação entre os dois trabalhos se desse no plano do corpo e este as organizasse, e não dada a partir de possíveis conceituações anteriores às vivências. João Ricardo acompanhava os performadores nesse processo, gerando novas possibilidades de visão dos materiais, relacionando o trabalho de Renato e Jussara com a construção/criação da direção. Ao mergulhar nesse caldo criativo, o diretor Norberto Presta desenvolveu, como um tecedor, os materiais do grupo em direção a uma dramaturgia cênica própria.
Se nos apoiarmos nas linguagens da dança e do teatro, e principalmente em sutilezas de criações do corpo, o que se constrói em cena? Em busca dessa resposta ou do aprofundamento da questão foram estruturados os processos de ensaio, colocando sobre o mesmo tablado estas orientações diferentes de linguagem, mas que, em níveis mais profundos, se conectam e geram outros campos de poesia em cena.
Colocando o performador em relação direta com o espectador, verificamos a delicada borda líquida que separa arte e vida, espectador e performador: ambos são seres em criação conectados por um mundo de virtualidades geradas pelos corpos.
O que: Estréia FUGA!
Onde: No espaço do LUME-TEATRO
R. Carlos Diniz Leitão 150, Barão Geraldo, Campinas - SP
Quando: de 07 a 11 de dezembro de 2007
sempre às 20:30

segunda-feira, novembro 26, 2007

im the man in the box


foto by dessa
zazous.blogspot.com

ficaria feliz se fosse apenas isso


esse menino não pode sonhar. suas pálpebras foram queimadas num sol sem fim de meio dia. impressionante, atravessando a ponte com os pés e a alma descalços.
um menino intoxicado pela luz ofuscado pelo álcool grosso dos butecos, babando palavras contraditórias.
prenhe de uma dor surda, abandonado até a medula.
natimorto em pleno dia:
"eu sou filho do alemão. eu sou filho de índio. eu vou matar josé"
o sangue preto nos joelhos farelento nos cantos da boca recordavam uma fúria ainda viva.
gostaria que você visse os olhos desse menino. perdoe-me, eu não gostaria que você o visse. mas você deveria tê-lo visto.
ele poderia estar morrendo de coma alcoólico, não sei. estava em coma de pé, ao meio dia, locomovendo-se nú, desmoronando-se, pele e ossos e furor de um corpo de homem rasgando entranhas de criança.
homem que urra pressentido através da pele ainda fresca.
imagine você: esse menino, desesseis ou quatorze anos: sem regras. sem pais e sem país. sem comunidade ou descendência. sem nome pois sem língua. sem roupas. só aqueles cabelos brilhosos e pretos e pêlos, no buço, axilas, sexo.
todos caçoaram dele pois seus traços são diferentes sua pele é mais clara. mas o cabelo é de índio. e os lábios grossos também.
sem passado. sem sonhos pois sem pálpebras.
a beleza agressiva do menino caído.
imagine você esse menino.
ele não pode mais sonhar pois suas pálpebras foram queimadas pelo sol do meio dia. mas seu corpo teima em pulsar como essas florzinhas vagabundas que nascem
entre as pedras e esfregam na cara do mundo a coragem efêmera e irracional e estarrecedora da vida em si.
esse garoto é muito bonito e deve ser agora osso.
eu o vi atravessando a ponte ao meio dia.
eu não o vi. mas pressenti o calor da sua chama em páginas esquecidas, um fragmento de história jogado no lixo.
ficaria feliz se fosse apenas isso.

sábado, novembro 10, 2007

terça-feira, outubro 16, 2007

Memória e imaginação (trinta ítens pra trinta anos delirantes)


1- meu corpo-menino menor ainda pois deitado na cama de casal, dos meus pais, na casa de praia, na beira do mar. Os adultos todos atarefados e eu preguiça pura, olhando fixo para uma bola de plástico: e se ela pudesse se mexer sem que eu a tocasse? e ela mexeu, rodou devagar sob seu próprio eixo e eu saí correndo.

2- Minha avó me contou que eu chorava a noite pois ouvia o canto das baleias. o som do vento uivando nas dunas que o muro da casa mal continha. a pequena floresta de pinheiros. fiz umas armadilhas ali, buracos com gravetos em cima, palha e a areia da praia. alguém poderia quebrar o pé. eu mesmo me joguei na armadilha. o terreno cedeu um pouco, pulei, os galhos quebraram e fui engolido.

3- Uma água viva entrou na minha sunga e me queimou a bunda. Minha avó tinha que ter contado pro filho do vizinho. ele ficou pelado na minha frente balançando o pinto. a velha avó dele olhou minha mão e disse, tens um “eme” escrito aqui, que é de morte mas de também de mãe. eu saí correndo. o filho do vizinho não tem vergonha eu tenho. eu perdi os meus carrinhos na praia. Fiquei olhando as nuvens e ouvindo o mar rezando pra que deus me trouxesse eles de volta. eu rezei e fiz promessas. descer uma escada gigantesca de joelhos em cada degrau rezando um pai nosso para que as minhas sementes que estavam nadando na piscina não engravidassem a tia gorda. incesto é um crime muito hediondo. De joelhos, um pai nosso por degrau.

3- De tardezinha, da janela da lavanderia, quando o céu ficava vermelho roxo eu via ali, parado no ar, flutuando de prata no céu, um disquinho voador, de ferro, perfeito, sombreado, uma imagem muito nítida, inclusive a cúpula de vidro. durante as madrugadas eu me levantava e ia para a janela pra tentar ver eles. eu vi umas luzes fortes no céu, umas estrelas que voam baixo. A estrela mais forte de todas, a primeira que aparece, em cima dos carros cheios de sereno da vizinhança, na frente da janela do quarto, antes de sair o sol, antes do cantar dos passarinhos, antes da luz azulada que vem rompendo a noite, ela ficava parada ali me observando, dizia que ia começar o dia. Muita falta de ar eu sinto dona estrela e o sabiá já começando seus assovios, eu sendo levado nos ombros do meu pai pro hospital, como um boneco, gordo de tantos casacos e cachecóis, fim da madrugada com o vento gelado batendo no rosto pela janela do carro. Tentando respirar. Pra que ir direto ao hospital se podemos passear nas ruas vazias e ver os vitrais da igreja central e as padarias de portas fechadas chaminés abertas expelido cheiro de pão?

4- Me perdia sempre no supermercado. A cada saída uma perdida. Uma coleção de bichos no formol. Um deles era uma larva gorda e branca, com o passar do tempo ela virou um pedaço de cocô. A geladeira ligando e desligando durante a madrugada inteira. Umas sementes que eu joguei na floreira viraram flores. Uma semente de abacate que eu plantei virou uma árvore que rapidamente já estava muito maior do que eu, apesar de eu ser bem mais velho que ela. Onde foram parar aqueles bichos recheados de isopor que minha mãe pendurava nas paredes do meu quarto?

5- as nuvens no inverno gaúcho passam gordas e pesadas de chuva nos fins de tarde depois da escola. me dava uma tristeza aquelas fins de tarde. Voltar pra casa escura, infestada com aquele cheiro de flor. Mãe, isso é florzinha de cemitério, não é pra ter em casa.

6- Eu queria chegar no outro dia e não ter sido trocado por alguém que não sou eu. Nas tempestades de raio pessoas são trocadas. Mesmo corpo conteúdo diferente. Eu devo ter sido trocado na tempestade, estava relampejando muito eu marquei de fazer um sinal no dia seguinte, na escola, para que o meu melhor amigo ficasse sabendo que eu continuava o mesmo. não dei um sinal algum, tão pouco ele. Ele. Ele deve ter sido trocado.

7- um charuto, de metal límpido com uma luz na ponta, parece um balão ou um dirigível, mas não. voava baixo demais, cortando o chumbo próximo do céu prenhe de chuva, na volta do super, eu vi sim, pela janela do carro dos meus pais.

8- meu quarto era pintado de azul escuro, simulando o fundo do mar. pedras de isopor pintadas passavam por pedras submarinas, cobertas de seres vivo multicoloridos: corais peixes e conchas. em um buraco vivia uma moréia negra. através de dança, algas cor de rosa, criavam o refúgio perfeito para ela, uma fenda no ventre da pedra. Havia também luzes de néon que desenhavam peixinhos na parede. (MEU DEUS EU BOTEI NEONS NA PAREDE DO ANDY/EDIE jurando que estava sendo influenciado pelo Dan Flavin. O QUANTO DE FANTASIA INFANTIL TEM NAS MINHAS PEÇAS?) Braços de manequins pintados de dourado serviam para pendurar minha mochila, boné ou o uniforme do colégio azul marinho com listras laranja, eu quero ir pra aula de escafandro. Não consigo respirar.

9- Percorrer lugares abandonados no sonho. Um colégio de muralhas de pedra vazio. Todo aquele espaço, ginásios corredores laboratórios museus banheiros teatro. As escadarias sótãos e porões. Equipamentos empoeirados, bichos empalhados bichos em vidros virando cocô com o tempo. a biblioteca com móveis de madeira escura e os janelões de vidro fosco sempre lacrados. homem e seus símbolos manual da auto-destrutividade humana. Atrás das cortinas em farrapos de veludo vermelhas moram fantasmas.

10- Ficar tardes inventando histórias em casa olhando as figuras já tão vistas da Enciclopédia da Luta Contra o Crime, eu pintei os olhos dos criminosos de vermelho. Desenhar monstros em papeizinhos, monstros da tv monstros dos livros monstros do espaço diabos caveiras e palhaços. Desenhar dinossauros e monstros e depois colar tudo nas paredes. A psicoterapeuta disse em segredo pros meus pais que eu era suicida. Eles me tiraram da terapia. Que ações de criança eu ainda faço? Minhas paredes ainda estão lotadas de monstros.

11- Itinerário de infância: imaginava a minha vida como um filme. No cartaz uma foto em destaque já que eu sou o principal. Os outros personagens que eu conhecia ao meu redor, menores, rostos em fotografias do tamanho da sua importância, a família, os amigos e o professor de educação física.

12- nunca gostei de heróis. os heróis são chatos e sempre ganham. Eu não ganho sempre. Queimei o rosto de um Comandos. Ele foi torturado e virou do mal.

13- Meus irmãos ganhavam uns presentes que eu adorava. A luva do Freddy Krugger. O boneco de borracha, monstrinho que mexe os olhos, o marrom, o mais perfeito.

14- No meu laboratório caseiro já assassinei muitas formigas com eletricidade. E aprendi que as formigas voltam após a morte. Formigas- zumbis são um inferno. O melhor mesmo é esmagá-las.

15- Fiz uma tatuagem no meu irmão com a ponta de uma faca incandescente

16- Apanhei uma boa surra por isso

17- A idéia era marcá-lo com um sinal que não desaparecesse nem quando ele ficasse forte como o Rambo. O Rambo é tão forte e tem tantos cortes pelo corpo...

18- Um outro irmão nasceu e morreu. Vi ele mortinho no corredor e falei pra minha mãe: as vezes vejo o Juliano.

19- Os cadáveres ficam naquelas casinhas do cemitério, eles não tem pele, homens de músculo. Meu irmão tá na casinha também, eles tem cheiro ruim. Homens de carne que é igual a carne que a gente come. Os coveiros ficam ali o dia todo passando perfume neles.

20- Tive que optar não ser um monstro.

21- Por vezes eu sou um monstro. Por vezes não.

22- Como é isso de se perceber homem e coisa? Carne e imaginação? Herói, não.

23- Brincar de sapo. Brincar de amor. Brincar de lembrar.

24- Ouvir músicas retrô e achar muito bonito, quando o sol bate de tarde no quarto da minha mãe em cima da cama eu gravo músicas do rádio, meu corpo menino menor ainda pois deitado na cama dos meus pais. Esparramado sobre o luminoso cobertor abóbora, orelhas amplificadas pelos fones um mickey-dj. fiz muitas fitas "muzicas de zuzeso". Retrô antes e retrô agora. Eu faço cds pros meus amigos. Faço cds pros ensaios. Minha mãe mandou o cobertor por sedex.

25- To me mijando. Aquela solidão que dá quando o último canal sai do ar e aparece o colorbar, são apenas três e meia da manhã e ainda vai demorar para amanhecer. Vai estourar o xixi e eu estou petrificado ouvindo o chiado da TV fora do ar.

26- Eu não tenho mais vontade de ir a aula.

27- Parece que tem um polvo enrolado no meu peito.

28- Quando eu fico com asma eu pareço um edifício com as janelas fechadas.

29- Filmes de terror. mãos com unhas de ferro são um fetiche bárbaro. um dos meus primeiros papéis importantes: um monstro que aparecia num quadro ameaçando a todos com o corpinho ossudo de adolescente, muita vergonha, raiva e unhas de punhal. Me disseram logo que eu não era um bom ator. o filho dele era um bom ator. minha primeira paixão foi um bom ator de treze anos com um papaizinho bem orgulhoso. ele virou um homem horroroso e eu continuo sendo apenas um ator.

30- Estas foram as coisas doces. Como enfiar as mãos numa poça de lama, brincar com água, com fogo, com ferro dando golpes de facão na árvore para vê-la chorando branco. das outras não ouso. nem em pensamento. Doce como ouvir aquele piado horrível que sai de lá que pássaro fantasma noturno. Os assovios começavam a vir muito próximos, o farfalhar de asas na janela, era o piante.

sexta-feira, outubro 05, 2007

Surpreender-se com um velho amigo

Nós estávamos brincando sem brincar, conectados com a matéria física da imaginação. corpos imaginantes, homens feitos de imaginação. Se pensar é esculpir como falava Beyus, o teatro pode ser uma grande escultura formada no abraço dos corpos imaginantes da platéia e dos performers.
Uma noite muito estrelada: saímos de madrugada para jogar. A noite não estava estrelada, nem era noite. Não interessa, pois fêz-se noite pois fechamos os olhos e logo umas luzinhas ligaram-se no espaço. Pisca-piscando. Um baile. Divertimentos noturnos, contar histórias, dançar imóvel, correr pelado, cantar com os sapos, um pic-nic de comidas de barro.
Nosso cotidiano banal contém o mundo e uma esfera poética insuspeita como a técnica dura também contém um território de mistério onde o que se é não interessa, basta ser. Um espetáculo de teatro pode ser justamente uma caminhada do cotidiano ao sonho, onde um não anula o outro. Razão emocionada, a lógica do delírio. O adulto não anula a criança ou o velho. A imaginação não anula o pragmastimo do cotidiano: é tudo vida. Talvez seja nesse paradoxo que possa nascer uma relação de arte.

sábado, setembro 29, 2007

Astronauta INSONE


Eu poderia segurar o tempo com uma rede? Ter vivido até aqui só pode ser uma forma de delírio. Delírio-criança: estar sentado e não alcançar os pés no chão. O corpo pequeno-leitoso- magro. Até onde eu me lembro? Objetivamente, tentando buscar a memória, ou melhor, trazendo as imagens até aqui. Engana-se quem disse que eu poderia me lembrar do meu corpo-feto, sonho intra-uterino. Se eu realmente me esforço consigo apenas chegar em camas flutuantes no cosmo. Engana-se quem disse que eu fui gerado de um espermatozóide que entrou num óvulo. Num ato orgânico de sexo dos meus pais. Não. Eu não estava lá. Eu estava navegando no espaço. Apareci no meu berço vindo diretamente de uma escuridão. Uma sensação tão linda, tão suave que achei que nascer fosse apenas acordar novamente na cama embarcação. Cama barco foguete cápsula casulo espacial. Isso pode ser considerado uma memória genuína: eu vim do espaço.
Antes do frenético desenvolvimento das minhas células, das dores nas pernas, das vergonhas repentinas como repentinamente nasciam os pêlos em lugares insuspeitos, dos tesões em brasa viva pelo melhor amigo. Antes de tudo isso.Eu pilotando minha cama em pleno espaço. Um casulo de cobertores, apenas meu rosto de fora, muito triste são as estrelas, são tantas, e estão todas tão longe uma das outras, e é tudo tão grande, só pensando em chego até elas, e mesmo assim , chego apenas a ver as luzinhas, desconheço se são bolas de gases incandescentes, estrelas que morrem estrelas que nascem buracos negros supernovas. as estrelas pra mim são luzinhas distantes que me observam silenciosas, como eu as observo, silencioso navegador do nada.
Então, antes de do meu corpo adolescente explodir do interior do meu corpo criança, me disseram que havia ali no espaço o deus. Me disseram que ele é a imagem e a semelhança do homem. Então se for assim o deus aqui é esse homem barbudo mas também tem o deus caramujo o deus das peles verdes e gosmentas dos homúnculos, o deus raio e o deus de guelras que nada nos abismos. Existem tantos deus quantos existem homens. E de madrugada, afundado nos cobertores ouvindo cada ruído da casa e da rua, todos dormindo e eu com os olhos abertos mesmo sem luz alguma para ser enxergada, na madrugada com o cosmo inteiro dançando na minha cabeça, eu esperava morrendo de medo o momento de ouvir o barulho do elevador. Todos dormindo. Como ele teria entrado no prédio se não tinha as chaves. Por que ele é deus. Por que ele não é desse planeta. Ele está subindo em direção a porta da minha casa. O silêncio perfeito das noites citadinas de cortinas e persianas fechadas. E a batida repetida na porta. Eu paralizado vou em direção ao barulho. Não pode ser mas é, olho por baixo da porta e nada. Ligo a luz do hall de entrada e agora ele sabe que eu estou aqui, não tem escapatória. Ele bate com mais força na porta e eu abro. É um velinho. Pede pra entrar. Senta-se na sala. Pede uma coca-cola. Eu teria um infarto se deus viesse me visitar na madrugada.
Mais ainda. A cama navegando por uns riachos, entrando num túnel, despencando. Eu queria segurar a fúria do tempo com uma rede. Amarrar o corpo para que dentro dele não saíssem mais corpos, para que eu não mudasse tanto, pra não ter que ver o feto morto a criança morta o adolescente morto o homem morto o velho morto e a ossada morta. Como segurar o tempo do corpo com uma rede, laçá-lo, restringi-lo? Não, ele escapa por entre os nós, pelos buracos o tempo cresce líquido, escorre pelos canos do corpo respira a vida das células. Dá e tira. E eu sempre tendo que acompanhar os batizados e funerais de cada corpo que me compõe no tempo. Sempre dando olá e já dizendo adeus.. Sempre angustiado com essa montanha–russa que é a vida.
Ou não. Eu não deixei sequer uma célula para trás. Se eu tivesse um zíper você poderia me abrir e ver um segundo eu mais jovem, e logo depois outro e mais outro até achar um núcleo feto pulsante, ou um núcleo sonho. Mais. Ao mesmo tempo que você abrisse o zíper iria se deparar com camadas que não seguem ordens cronológicas, de repente se assustaria me vendo com cem anos virado em pele e ossos pensantes, ou o rosto húmido de tanto amor compartilhado que ainda nem pressenti. Não sei.
Ou melhor eu sei. Não é nada disso. Nada de corpo ossos brotando do corpo criança. Do corpo ossos brota o corpo carbono brota o corpo atômico. Não. Eu nem saí da minha cama embarcação. E já fico com uma saudade profunda de coisas que nem vivi ainda, saudade das coisas que imaginei imagino e imaginarei. Eu sei que qualquer madrugada eu poderei estar navegando em águas rasas e que meu corpo homem queria ser corpo coisa: terra, nuvem, girassol, baleia, chamas, pedregulho, lamaçal, átomos dos átomos. Nesse momento eu nem precisarei fechar meus olhos: eu sou um astronauta e estarei num foguete rugindo em chamas rompendo a atmosfera. Voltando veloz pro delírio silencioso das estrelas.

sábado, setembro 15, 2007

Efeitos físicos não determinados.

Necessário dizer que é sempre bom conferir novos trabalhos de artistas que curtimos faz um tempão. No caso conheci Jay-Jay no apartamento da Margarida, uma colega, atriz portuguesa nos idos 2004 quando eu estava trabalhando lá no Estágio Internacional de ACtores. Ela botou "it hurt me so" do álbum "Whiskey" e me apaixonei pelo magrelo de voz de cro*ner na hora. Agora o cantor-compositor sueco trás um novo álbum que é belíssimo e tem um nome um pouco longo: "The Long Term Physical Effects Are Not Yet Known". Depois de entrar numa viagem em que flertou com o electro, inclusive criando uma persona com visual totalemnte body-corpse que debocha e provoca o mundo fetichisado da moda e do consumo do corpo em "ANTENNA" (super influência em termos de atitude e visual para minha encenação de ANDY/EDIE), ele volta as raizes do trip-hop. The Long Term um álbum soturno mas delicioso de ouvir. Retoma os temas da solidão, das despedidas, do coração quebrado. Batidinhas eletrônicas, instrumentos melódicos e melosos. Melancolia é a palavra que mais vai ser lida associada a Jay-Jay em uma breve procura pelo google. Uma melancolia boa, como tirar casca de ferida, relembrar de velhos amores, ver o mundo com o filtro de um pessimismo afetivo, que não se deixa destruir mas incorpora tmbm a dor, a suave tristesa e a perplexidade. Fora isso a voz continua um veludo. Boníssimo pra ouvir sozinho lembrando do seu cara. Bom pra ouvir e lembrar do amor. Para ter saudade. Para inventar um amor. Para ouvir vivendo um amor. Ae vai um videozinho da ótima "she doesent lives here anymore"

GRINDHOUSE!

O projeto do duo nerd Tarantino e Robert Rodriguez, GRINDHOUSE é super legal. Acabei de ver o primeiro , PLANET TERROR, dirigido por Rodriguez. O filme faz um mergulho na estética da sessão da tarde ou do SBT, filmes que víamos quando éramos crianças, edição tosca, roteiro absolutamente debochado e cheio de diálogos-situações mirabolantes e sanguinolentas. Planet Terror é sobre uma cidadezinha no interior dos EUA fronteira com o México que se vê as voltas com uma multidão de zumbis. O filme homenageia os gêneros trash e capricha na direção de arte cheia de catchup tripas voando e heroínas bizarras como a gogo dancer da perna de metralhadora e a médica das mãos quebradas.
Um charme a mais nesse projeto é que junto aos filmes são apresnetados trailes fake de outros filmes trash. O Planet terror começa com um filmezinho pelo qual fiquei viciado: MACHETE!
assistam ae pra relembrar aquela excitaçãozinha nerd furiosa igual a quando éramos adolescentes e assitimos pulp fiction em algum cinema de rua já extinto.

Yesterday He Was A Decent Man Living A Decent Life. Now He Is A Brutal Savage Who Must Slaughter To Stay Alive.
They just fucked with the wrong Mexican
A boa notícia é que Robert Rodriguez VAI FILMAR O MACHETE INTEIRO.
Aguardo ansisamente.

segunda-feira, setembro 03, 2007

Pensamentos digestivos & reducionistas de João de Ricardo =D


sobre uma possível tentativa de reler "for the love of god" de damien Hirst no Brasil

nacionalidade define suporte:

inglês - caveira -diamante

brasileiro - caveira de gesso - strass

nacionalidade define valor:

inglês - 100 milhões

brasileiro -50 reais

nacionalidade define espaço:

inglês - galeria

brasileiro -encruzilhada

Para tirar o recalque!

Sempre admirei o trabalho do Damien Hirst vide a referência a sua obra claramente expressa no subtítulo de Extinção, peça que encenei faz uns anos "a impossíbilidade física da morte na mente de alguém vivo". è aquela do tubarão no minimalista formol. O cara é foda no conceito, foda na execução e foda no marketing pessoal. É impossivel não pensar na filiação entre o papa Warhol e o filhote Hirst. Ambos foram abençoados pela esperteza e pelo toque de midas. Hirst exacerba esse toque de midas em sua obra "for the love of god" um crânio humando totalemnte cravejado de diamantes. A peça foi vendida recente mente pela pechincha de 100 milhões de dólares. Sim. Podemos pensar no fetichismo do objeto de arte levado as últimas consequências nessa obra irônica de Hirst. Aliás quem sai ganhando é ele. A obra custou só de material ehhehe 15 milhões de dólares. Isso é dinheiro que eu nem tenho condições de avaliar tamanho número de zeros.
O engraçado e esse sentimentinho de inferioridade que dá quando penso que ainda não ganhei 1000 reais por mês com meu trabalho de encenador e arte educador.
Não é?
Então eu fiz um videozinho para tirar o meu recalque
ai está
a anatomia da boneca parte dois
enjoy


Dia 17 de setembro estaremos dando carão GLACIAL no POA EM CENA!

sábado, setembro 01, 2007

Vídeo institucional do GROTE PERPLEXIDADE

feito pelo Papai
=D

;) uma piadinha pra acalmar os ânimos


Pensamento do dia:

Gordon Craig está chorando, o supermarionete virou supermanequim

João de Ricardo

(auhauhaauh)

sexta-feira, agosto 31, 2007

Ser selvagem

Foi no "Bar da Coxinha", depois de muita conversa sobre arte e essas coisas que nos entopem as veias da alma, que a Ariana falau de cabeça um fragmentozinho de "A Passagem das Horas" do Fernando Pessoa.
Confesso que na hora aquilo me bateu super profundamente pois me sinto um pouco assim, depois de 12 anos de estrada na arte do teatro e na arte em geral, me sinto perdido, fazendo meu pré projeto de mestrado sem ao menos saber o por que de eu ter cehagdo até aqui, desse invetimento todo, num environment de capitalismo tardio brazuca que clama por produtos e onde o cidadão trasformou-se em consumidor. Trabalhar aqui com conceitos nebulosos, idéias passeantes e a efêmera arte do espetáculo que , vamos ser sinceros, tá longe do entrar na máquina do mainstream, só aumentam minha perplexidade. Que futuro aguarda o "fazedor de teatro" em menção a bela peça de Thomas Bernhard? O sedutor devir de outras formas de mediocridade mais rentáveis estão sempre a espreita. E assim me reaparece Pessoa, no trecho que a garota citou, e eu procurei no google e estava lá, inteirinho e lindo, pra vcs um petisco lusitano melhor que pastel de belém:
A Passagem das Horas, FRAGMENTO:
..."A certos momentos do dia recordo tudo isto e apavoro-me,Penso em que é que me ficará desta vida aos bocados, deste auge,Desta entrada às curvas, deste automóvel à beira da estrada, deste aviso,Desta turbulência tranqüila de sensações desencontradas,Desta transfusão, desta insubsistência, desta convergência iriada,Deste desassossego no fundo de todos os cálices,Desta angústia no fundo de todos os prazeres,Desta sociedade antecipada na asa de todas as chávenas,Deste jogo de cartas fastiento entre o Cabo da Boa Esperança e as Canárias.
Não sei se a vida é pouco ou demais para mim.Não sei se sinto de mais ou de menos, não seiSe me falta escrúpulo espiritual, ponto-de-apoio na inteligência,Consangüinidade com o mistério das coisas, choqueAos contatos, sangue sob golpes, estremeção aos ruídos,Ou se há outra significação para isto mais cômoda e feliz.Seja o que for, era melhor não ter nascido,Porque, de tão interessante que é a todos os momentos,
A vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger,A dar vontade de dar gritos, de dar pulos, de ficar no chão, de sairPara fora de todas as casas, de todas as lógicas e de todas as sacadas,E ir ser selvagem para a morte entre árvores e esquecimentos,Entre tombos, e perigos e ausência de amanhãs,
E tudo isto devia ser qualquer outra coisa mais parecida com o que eu penso,Com o que eu penso ou sinto, que eu nem sei qual é, ó vida"...
O grifo obviamente é meu. Entendam como quiserem. Ah pra quem quiser a obra completa do moço da na ineternet. procure no google! =D

Im in love with your brother.

O Bruno Barreto em mandou o link do youtube de uma canção (!!!) já antiguinha de 2003 (!!!) do The Knife. É uma banda sueca formada por dois irmãos: uma garota e um garoto (um gatinho por sinal). O clipe é boníssimo e posso enxergar nele questões interessantes como a do simulacro. Bom não vou ficar aqui escrevendo sobre simulacro, quem tiver curiosidade pode procurar no google "simulacro" e "baudrillard". Faz bem pra cabecinha. Mas enfim, vender gato por lebre seria algo do tipo. Agora entenda isso quanto uma questão estética recorrente na pós-modernidade.
hohohohoh
ae vai o clipe pra quem quiser ver e se deliciar. Som e imagens bem legais. Cafona e sexy.

quinta-feira, agosto 30, 2007

Para não passar em BRANCO


Essa entrevista deveria ser publicada na ZH o jornal que comanda Porto Alegre, da RBS, claro...Globo vc já sabem bem quem são essas pessoas. Mas como todos sabemos, ao mainstream o que é do maisntream. Ou seja, entrevista feita e nada de espaço para publicação no jornal, isso que ela foi realizada por um peso pesado do jornalismo cultural portoalegrense o Renato Mendonça. Ae ele publicou no blogue dele http://www.renatomendonca.com/blog.php , legal! A entrevsita está massa e agradeço ao Renato pelo interesse.

Esse tipo de coisa só colabora para a minha visão azeda quanto a pátria das bombachas. Por mais que Porto Alegre se esforce, o peso da pretensão, da classe média culturalmente fetichista por obras já canonizadas e de uma visão muito curtinha da amplitude e complexidade do fazer artítico, geram incontáveis anomalias. Prêmios não pagos, espaços na mídia para os de sempre, clássicos sempre revisitados e essas coisas que gaúcho adora: chimarrão e concertos comunitários Zaffari. auhuhauhauha


Ae está a entrevista


OPS: Obrigado Renato

=D


Para não passar em BRANCO:


Jornalismo é um perde-ganha. E o que essa frase não tem de original tem de correta. O espetáculo Andie/Edie, por exemplo, não teve a devida atenção e cobertura que deveria ter tido por uma série de infelizes acasos. E esta atenção poderia estar dirigida a vários focos: a evolução de João Ricardo como diretor, o novo público que a peça trouxe para o teatro, o uso de mídia eletrônica na encenação, o seqüestro que o grupo Cia Espaço em Branco (www.ciabranco.blogspot.com) fez do Arena para denunciar o não-pagamento pelo Estado do Prêmio de Incentivo a Produção de Artes Cênicas (R$ 15 mil, até hoje não pagos). Por enquanto, fiquem com a entrevista que fiz por e-mail com João Ricardo, atualemnte estudando na Unicamp.
A primeira temporada de Andy/Edie levou um público diferenciado ao Teatro de Arena, um público de perfil jovem alternativo. Cheguei a ver espectadores com figurinos na platéia. Além disso, vocês promoviam (e promovem) festas. É uma maneira de atrair um novo público ao teatro? Ou é esse novo público que finalmente reconheceu sua cara no palco?

A Cia espaço em BRANCO tenta fazer um teatro absolutamente fiel aos seus componentes. Nós fazemos festas porque gostamos de festas e estamos sempre em festas. Além do que, tanto as festas quantos os outros eventos que promovemos (shows de bandas como Pink Floyd das Antiga e Filipe Catto ou o encontro POPIMPACTO) ligados a encenação de ANDY/EDIE seguem a lógica do próprio Andy Warhol, que além do seu conhecido trabalho em artes plásticas ainda promovia festas (as legendárias Exploding Plastic), atuava como cineasta, escritor, escultor e produtor de bandas. Claro que isso traz uma maior visibilidade para as ações da Cia. e realmente leva ao teatro um outro público. Muitas pessoas nos disseram que nunca tinham ido ao teatro até ver o Andy, pessoas que nos conheceram nesses eventos, além das pessoas que chegam em nós por vias digitais (a peça tem comunidade no orkut e webpage www.poacultural.com.br/andyedie). Mas também reconheço que poucos grupos de teatro em Porto Alegre pesquisam a relação do teatro com as outras mídias, tv, cinema, videoclipes, artes plásticas, web, etc o que talvez atenda a essa geração que está crescendo em frente as telinhas e que encontra em nossas peças a resposta artística a esses tempos onde já não podemos falar em pureza de linguagem. Definitivamente não somos escravos da linguagem. E não temos pruridos em atacar em vários fronts com o intuído de aumentar a superfície de comunicação com a sociedade, ou com o mundo. A mistura é nossa identidade. E talvez a identidade desse "novo público".

Fala um pouco do episódio esse do não pagamento do prêmio a vocês. A ocupação do Teatro de Arena foi a alternativa que vocês buscaram. Como ficou a situação?

O prêmio conforme o que está escrito no edital deveria ser pago metade quando o espetáculo estivesse em ensaios e a outra metade na estréia. O que dá um montante de quinze mil reais. Ensaiamos quatro meses e depois ficamos 10 semanas em cartaz e nada do pagamento. "Seqüestramos" o teatro de arena e promovemos shows e alongamos a temporada da peça, o que foi bem divulgado na mídia e nada. Nossa tentativa de responder a inação do estado com a nossa ação direta não se mostrou relevante. Na hora de pedir votos eles são os primeiros a sorrir. No nosso material gráfico a insígnia do estado está lá. Mas não recebemos um real sequer. Pagamos a produção do espetáculo com dinheiro do nosso próprio bolso, e além de estarmos obviamente endividados por conta disso, nenhuma artista, dentro e fora de cena recebeu ainda seu cachê. Este deveria ter sido efetuado em junho do ano passado. Um ano depois, governos trocados a enfrentamos a mesma situação. O que nos dizem é que o processo saiu da Secretaria de Cultura e emperrou na fazenda. E como de praxe, lavam as suas e abrem novos editais.Ainda sobre o Arena. A ocupação foi um ato de protesto, mas também de afirmação da importância de um grupo contar com um espaço fixo para pesquisar e encenar. Tens alguma proposta nesse sentido? Que achas da idéia de grupos ficarem residentes em espaços públicos?

Acho que temos que ter espaços flexíveis que respondam a diversidade das produções cênicas. Espaços reservados à pesquisa e espaços reservados as apresentações. No caso do Arena, foi uma sorte poder contar durante meses com o teatro como espaço de ensaio e criação do espetáculo. Tivemos a oportunidade de criar um espetáculo onde cada fragmento se comunica com a especificidade de um teatro de arena. Cenários figurinos movimento, tudo foi concebido no atrito diário da nossa prática de trabalho com o teatro. Isso sem dúvida alguma produz peças com texturas que não seriam conseguidas em um esquema mais tradicional de ensaiar em qualquer lugar e depois adaptar a montagem ao espaço.

Fizeste assistência de direção para Luciano Alabarse em Antígona, um texto clássico, e em Heldenplatz, uma montagem realista. Contigo na direção, Extinção praticava um humor negro e próximo do surreal, enquanto Andy/Edie mergulha no universo pop e coloca câmeras em cena. É uma experimentação proposital?

Não concebo o ato de direção como o ato de "colocar em cena" um texto. Direção para mim é como um "work in progress" infinito, onde os passos desse processo podem ser vistos ao longo das encenações. Tanto nos meus trabalhos que se tornaram mais públicos como Serpente, Extinção e Andy/Edie quanto a trabalhos de vida mais efêmera como O Livro de Catarina e os tantos outros que dirigi em âmbito acadêmico (shopping and fucking, brasas, pretend) mantenho sempre o foco no trabalho do performer. Parto sempre do espaço vazio e do corpo do ator como célula primeira de criação. Todo o resto, palavra, luz som objetos são decorrências do jogo do ator, instrumentos para amplificar a já infinita capacidade do homem em cena de trazer pro visível o invisível. É no corpo do ator que as idéias do texto, as minhas idéias sobre o texto e tudo mais que tiver relação vão encontrar forma. Uma forma que transcende o próprio universo que o texto traz. Pois dou atenção a linguagem em si. Ao contar histórias o teatro também se conta como estrutura dupla da vida, calcada em nascimentos desenvolvimentos e mortes. E é nesse instante que todas as peças que dirijo são uma só. Um grande "work in progress" sobre o homem e sobre o próprio ato de estar em cena.

Extinção e Andy/Edie, cada uma a sua maneira, investia no humor. Numa entrevista para o site PoaCultural (www.poacultural.com.br), dás a entender que o humor facilita a aproximação do público com temas mais pesados ou delicados. É isso?

O ato teatral já é cheio de tragicidade em si. Ele, como a vida, está exposto ao tempo e a finitude. Nós que fazemos teatro temos que fazer um exercício diário de desapego, já que a nossa obra se esvai a cada apresentação. Só isso já gera um peso, mas ai entra a fidelidade. Fidelidade ao aceitar que também rimos e que é o paradoxo que interessa. Trabalhar um gênero em sua pureza pra mim já é um exercício masturbatório, estamos em plena "modernidade líquida" como diz Baumman, qualquer tipo de certeza hoje em dia soa como artificialismo, já que as coisas mudam de forma e conteúdo com uma velocidade jamais vista. Assim, esses temas pesados acabam durante o processo adquirindo outras facetas, como o humor e a ironia o que entra de acordo com o que pensamos. O ser humano é múltiplo demais para nos fecharmos em um caminho só de comunicação. O humor cria pontes incríveis entre a platéia e o palco. O humor aumenta a rede de comunicação (como os elementos plásticos e sonoros da peça) e é isso que queremos: comunicar.Estás em Campinas estudando junto ao grupo Lume, na Unicamp. É um núcleo que privilegia a antropologia teatral e as performances, não? Isso não vem de encontro à linguagem sofisticada que praticaste em Andie/Edie?Fui convidado pelo Renato Ferracine do LUME para participar deste riquíssimo processo de investigação de linguagem chamado: "Território Nômade". Estamos trabalhando dentro da idéia de processo: reunir de forma prática, duas vertentes de trabalho sobre o performer brasileiras: a técnica do LUME relacionada ao teatro e a técnica Klauss Vianna, relacionada mais a dança. Para tanto trabalhamos com um grupo heterogêneo formado por pessoas vindas de uma tradição da dança: a coreógrafa Jussara Miller e as dançarinas Ana Clara Amaral e Carol Laranjeira e ao teatro: eu, o Renato Ferracini, além dos atores Eduardo Albergaria e Evelyn Ligocky (que aliás já trabalhou comigo em EXTINÇÃO). É no corpo dos performers que as técnicas estão se fundindo e nosso olho está atento as possibilidades poéticas que isso traz. Estamos de olho na capacidade do homem em estado cênico criar poesia, desvinculado dos territórios tradicionais das linguagens. E isso tem tudo a ver com os processos da Cia. Espaço em BRANCO. É belíssimo ver cada vez mais criadores no Brasil dando adeus a conceitos enferrujados de autoria e se lançando em processos coletivos onde as diferenças é que dão o tempero. A idéia de nomadismo é prática e não temos idéia de onde ela vai nos levar apesar de já termos estréia prevista para dezembro em São Paulo.

Quais teus planos? Até quando ficas em Campinas? A Cia Espaço em Branco já pensa em alguma nova montagem?

Fico em Campinas provavelmente até a estréia desse novo espetáculo. Quanto a novos trabalhos com a Cia., estamos muito inclinados a começar um trabalho de construção dramatúrgica própria. Mas isso pertence ao futuro.