domingo, dezembro 02, 2007

Hijikata com insolação



Um pouco de dor de cabeça, peguei muito sol hoje, o sol do meio dia no lombo, cozinhando as idéias que ainda estão muito perto do couro cabeludo. Estou lendo "Butoh, veredas dálma", livro de Maura Biochi sobre Butoh, obviamente. Escrevo isso depois de um ensaio aberto do FUGA! um xis burguer e convivência VERY humana. É interessante ver que realmente tanto a arte como a vida dependem dos mesmos mecanismos, e que é certo que o olhar edita. tanto o olhar particular quanto o olhar do outro são a chave e o centro da maravilha e do hardcorismo que é ser humano. Perceber e agregar a diferença é um assunto perpétuo uma dessas grandes questões colossais do pensamento humano. Até onde chegar com isso? Até onde a opinião do público, ou melhor dizendo, do outro, é válida como um estímulo a fomentar novas questões e ações ou até onde ela é apenas o rumor de uma insatisfação egóica que não vê a obra em si, mas apenas como "eu gostaria que ela fosse". Existem diferenças entre dialogar e servir a sua subjetividade como num buffet. O olho se alimenta e, no final das contas, percebe o gosto que quer. Somos reféns do olhar. Ao perceber isso, reféns e terroristas.
No livro, existe um capítulo chamado "o último discurso de Tatsumi Hijikata", discuro esse de um dos polos fundadores da idéia e da prática do Butoh juntamente com Kazuo Ohno. Digo polaridade pois se o paradoxo está na base do Butoh, as práticas e entendimentos de Hijikata e Ohno se contradizem e se completam. Coexistência do paradoxo.

No discurso proferido em razão de um festival de Butoh em 1985, ano da sua morte, Hijikata reflete sobre a razão da sua dança, e os pricípios poéticos da sua arte. A morte e a sombra são os norteadores do trabalho do artista japonês. Num dos parágrafos ele discorre sobre a importância dos mortos no sua dança:

"Muitas vezes eu disse que uma irmã mais velha vive dentro do meu corpo. Quando tento levantar ela se abaixa. Quando me ocupo da minha dança ela come as trevas no meu corpo. Quando ela cai, isso significa muito mais do que eu ficar em pé. Muitas vezes ela fala para mim:"você é doido pela sua dança.Mas o que você está tentando exprimir só poderia expressar se não expressasse. Não é Kuninho?

Por causa disso ela se tornou minha professora. Sim, os mortos são meus professores. É preciso respeitar os mortos e gostar deles. Mais cedo ou mais tarde seremos chamados também. temos que trazer os mrotos para pertod e nós e conviver com eles. Hoje em dia as pessoas apreciam apenas a luz. Mas a quem a luz deve a sua prórpia existência? Às costas das trevas, pois elas carregam luz. Os pequenos brincalhões devoraram as trevas.Agora a noite não tem mais obscuridade, nem trevas. No passado as trevas eram claríssimas."

O que dizer após isso? Quem são esses mortos ou o que são? Quem são os mortos que animam a a arte que tento fazer? que arte é essa? A luz vive da treva e vice-versa, quem nutre minha luz? E a sua?
Apenas transcreví esse trecho para compartilhar e continuar o spam mental, ou a escultura de pensamento desse grande artista. só o eco da sua arte já mexe profundamente. Prova irrefutável de que Hijikata estava correto em relação aos seus e nossos mortos e sobre uma das infidáveis e paradoxais possibilidades da arte: a mastigação da treva. Seja isso visível ou invisível para você.

Um comentário:

Unknown disse...

ADOREI A INQUIETAÇÃO, A REFLEXÃO, A VIDA QUE MARCHA COM CERTEZA EM DIREÇÃO A MORTE QUE NUTRE OUTRAS VIDAS!HIJIKATA DIZ QUE SE ELE FOSSE FELIZ NÃO FARIA BUTOH! ACHO A FRASE GENIAL E FICO FELIZ DE SER INFELIZ E VICE VERSA....
FOI UM PRAZER TE LER E TBÉM ESCREVER
BJ
CAMILA